“Ao nascimento biológico do ser humano sucede o seu nascimento psicológico.”
As relações precoces são as relações de dependência do bebé com os adultos que cuidam dele. A imaturidade do ser humano torna-o dependente dos outros membros da espécie, dos adultos, ao nível da sobrevivência (lentificação).
No entanto, esta relação diferencia-se dos outros animais, uma vez que o ser prematuro depende e precisa dos cuidados dispensados pelos pais ou por outros cuidadores, para sobreviver física e psiquicamente.
Esta necessidade adaptativa que começa com os cuidadores designa-se de vinculação. Define-se como laço afetivo mútuo entre a criança e a figura de vinculação e visa o seu sustento e proteção.
Tal dependência social do ser humano começa logo após o nascimento nas relações que o recém-nascido estabelece com a mãe ou figuras que cuidam dele (figuras maternantes). Desta relação dependerá o que seremos no futuro, no domínio da construção das relações com os outros e na construção do eu psicológico.
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A importância da relação mãe-bebé. |
Perante o inacabamento do bebé humano e a sua prematuridade, as relações precoces apresentam-se vitais para o desenvolvimento e sobrevivência do mesmo. A complexidade das relações que se vão estabelecendo desde o nascimento, está estreitamente relacionado com as competências básicas do bebé e da mãe.
Assim, é a prematuridade do recém-nascido que permite o estabelecimento de relações precoces, dispondo-o para o desenvolvimento de competências relacionais.
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Atividade fortalecedora da relação mãe-bebé. |
A criança vê-se determinada pelas primeiras fases da vida, uma vez que estas asseguram as condições para a sua sobrevivência e desenvolvimento.
O que é uma relação precoce?
É uma relação recíproca que tem por base o conjunto de comportamentos (sorrir, chorar, agarrar) que nos primeiros tempos de vida permitem estabelecer a ligação afetiva entre a criança e quem cuida dela, isto é, a progenitora.
O que é a vinculação?
É um comportamento que permite à pessoa aproximar-se ou estabelecer proximidade das suas figuras preferenciais ou privilegiadas.
É de salientar a importância conferida à vinculação, já que esta consiste na necessidade de elaboração de laços afetivos e de aproximação com um indivíduo que transmite segurança e proteção, a fim de estabelecer contactos físicos ou de proximidade. Tal como o ato de comer e beber constitui-se uma necessidade primária/vital, o mesmo podemos dizer da necessidade de vinculação.
Neste sentido, esta relação é uma necessidade básica, essencial ao desenvolvimento mental do ser humano bem como ao desenvolvimento da sociabilidade, expressando-se através do choro, da fome, entre outros.
Vantagens da vinculação:
- Estruturação da sexualidade: relacionada com as representações relacionais que se constroem durante a primeira infância.
- Regulação emocional: depende de toda uma construção de afetividade que a vinculação permite.
- Interações sociais positivas: vínculo seguro e confiante que desenvolve sentimentos de segurança e confiança nos outros.
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A importância do vínculo do amor no começo na vida da criança. |
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Harry Harlow. |
Harry F. Harlow (1905-1981) foi um psicólogo norte-americano que ficou conhecido pelas suas experiências sobre a privação maternal e social em macacos Rhesus, e que demonstraram a importância dos cuidados, do conforto e do amor nas primeiras etapas do desenvolvimento.
Duvidou das teorias que afirmavam que o amor começava com uma ligação à mãe, como fonte de alimentação, e se aplicava aos demais membros da família por extensão.
Desenvolveu a teoria de vinculação na obra “A natureza do amor”. Harlow, nas suas experiências, utilizou macacos Rhesus que exibiam um leque de emoções e que necessitavam de cuidados maternais, embora estes sejam mais maduros após o nascimento do que os bebés humanos.
As experiência etológicas de Harlow
Harlow começou por separar alguns macacos das respetivas mães, durante 6 a 12h após o seu nascimento e, posteriormente, isolando-os numa jaula juntamente com “mães substitutas” constituídas por arame e madeira ou revestidas de arame felpudo. Deste modo, as várias experiências decorreram em várias jaulas.
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Mãe felpuda (esquerda) e mãe de arame (direita). |
Ora, numa das suas experiências, ambas as “mães” estavam presentes na jaula.
Uns recebiam o leite da mãe de arame, enquanto outros recebiam-no da mãe de tecido. Mesmo quando a alimentação provinha da mãe de arame, o macaco passava grande parte do tempo agarrado à mãe de tecido e era a ela que recorria quando se encontrava assustado.
Os macaquinhos que foram crescendo com as mães artificiais ficaram pretificados de terror quando eram colocados em situações novas, sem a presença da mãe felpuda.
Harlow concluiu que a necessidade e a procura de contacto corporal e proximidade física são mais importantes que a necessidade da alimentação.
Inicialmente, Harlow pensou que a mães felpudas satisfaziam totalmente as necessidade emocionais dos bebés macacos. Numa observação, os bebés viverem durante 3 a 6 meses isolados com as mães substitutas, parecendo saudáveis e normais. No entanto, manifestavam:
- Comportamentos compulsivos, movendo-se em círculos ou baloiçando o corpo para trás e para a frente.
- Falta de interesse por outros macacos ou pessoas.
- Sexualmente desajustados, não se relacionando sexualmente com macacos do mesmo sexo.
- Quando as macacas ficavam prenha, os machos mostravam-se incapazes de cuidar dos filhos e rejeitavam-los agressivamente.
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Experiência de Harlow e a privação materna. |
As razões foram atribuídas à privação ou défice de estimulação sensorial, perceptivo e social.
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John Bowlby. |
Bowlby desenvolveu uma série de investigações relativas à relação entre as perturbações de comportamento e a história de infância. O psiquiatra, especialista e psicanalista inglês estudou os efeitos do cuidado materno sobre as crianças. Bowlby ficou impressionado com as evidências de efeitos adversos ao desenvolvimento, partindo das observações sobre o cuidado inadequado após a separação.
Os estudos primordiais de Bowlby deram origem à Teoria Apego (TA).
O psicanalista considerou o apego um mecanismo básico dos seres humanos. Isto é, um comportamento biologicamente programado, como um mecanismo de alimentação e de sexualidade. O papel do apego na vida dos seres humanos envolve o conhecimento de que uma figura de apego está disponível e oferece respostas, proporcionando um sentimento de segurança e fortalecendo a relação.
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TA (Teoria de Apego). |
De acordo com Bowlby, o relacionamento da criança com os pais é instaurado por um conjunto de sinais inatos do bebé, que demanda proximidade.
Com o passar do tempo, um verdadeiro vínculo afetivo desenvolve-se. Por isso, um dos pressupostos básicos da TA é de que as primeiras relações de apego, estabelecidas na infância, afetam o estilo de apego do indivíduo ao longo da sua vida.
Após a separação da família, o especialista observou uma sequência de 3 fases/reações emocionais:
- Protesto- irritação e cólera;
- Desapego- indiferença e apatia.
As emoções e os comportamentos específicos foram concebidos para manter o filho perto dos que prestavam cuidados primários.
- Mecanismos de seleção natural, em termos evolutivos;
- Mecanismo natural de sobrevivência das espécies.
O vínculo entre a mãe e o filho faz parte da base biológica de sobrevivência: nascendo indefesos e completamente dependentes, os bebés estão geneticamente programados para se comportarem de modo a assegurarem a sua sobrevivência (e da espécie).
Aspeto positivo da vinculação: as crianças gostam de estar com a mãe, estabelecendo interações mútuas.
Aspeto negativo da vinculação: o medo inato do desconhecido ou do círculo familiar mantém a criança perto e presa/agarrada à mãe.
Entre os seres humanos, estes medos iniciais são difusos, tornando-se mais específicos à medida que os perigos são apreendidos.
“O bebé deve viver uma relação calorosa, íntima e contínua com a mãe (ou com a figura permanente), na qual ambos encontrem satisfação e prazer.”
Segundo este psicanalista de crianças, a rotura do lado materno com o bebé nos seus primeiros anos de vida tem efeitos negativos, permanentes e irreversíveis, no desenvolvimento intelectual, social e emocional.
Críticas à teoria de Bowlby:
- A irreversibilidade dos danos psicológicos nas crianças parece estar mais ligado à privação de qualquer vínculo afetivo do que à perda do vínculo com a mãe biológica.
- A desvalorização do pai, considerado um mero substituto da mãe tem vindo a ser mentira, uma vez que os bebés têm desenvolvido um forte apego em relação à figura paterna e tal dá-lhes a possibilidade de experiências qualitativamente diferentes.
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Mary Ainsworth. |
Psicóloga canadiana que confere à teoria de Bowlby um suporte observacional e experimental.
Grande impulso na Psicologia
Trabalhou com Bowlby, desenvolveu a teoria de vinculação e realizou estudos, na Uganda, sobre efeito de separação em 28 bebés, durante três anos.
Realizou, de igual modo, estudos experimentais em Bultimore (E.U.A).
Além disso, alargou a teoria de Bowbly, a “Base de Segurança”:
- A experiência de “Strange Situation” é o primeiro instrumento a permitir medir e sistematizar a vinculação, identificando padrões de apego em crianças entre os 12 e os 18 meses: o comportamento de criança é secretamente observado.
Assim, a relação dos pais gera segurança, permitindo ao bebé sentir-se livre para descobrir o mundo.
Ainsworth descreve o funcionamento desta “Base de Segurança” dada pelos pais a partir das experiências que desenvolveu.
Conhecida como “Situação estranha”, a investigadora regista o efeito de separação e do reencontro dos bebés entre os 12 e os 24 meses com a sua mãe:
- A mãe e o bebé entram numa sala estranha;
- A mãe senta-se, deixando o bebé explorar o espaço;
- Um estranho (adulto) entre na sala, conversa com a mãe e depois com o bebé;
- A mãe sai da sala, deixando o bebé sozinho com o estranho;
- A mãe volta e o estranho sai.
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Representação da "Situação Estranha". |
Segundo Ainsworth, a forma como o bebé reagia, quer à ausência da mãe, quer ao seu regresso, refletia o seu equilíbrio emocional, que relacionava com os cuidados que recebera.
Três estudos primários de vinculação:
- As crianças sentem-se confortáveis para explorar o meio, confiando na mãe respondente.
- Enquanto adultos, são pessoas que confiam, querem amar, não receiam a rejeição e encaram-se a si mesmos como dignos de afetos.
- As crianças afastam-se das mães que não as estimulam ou que as rejeitam.
- Enquanto adultos, são emocionalmente distantes e calculistas, céticos face ao amor, receiam a rejeição mas querem a proximidade e intimidade.
- As crianças ligam-se a figuras inconscientes e protestam muito quando as suas exigências não são satisfeitas;
- Enquanto adultos, consideram-se incompreendidos, têm falta de confiança, sendo carentes e obsessivos nas relações pessoais.
Os estudos prosseguidos mostraram a importância das primeiras vinculações e a sua qualidade influencia as relações que a criança vai estabelecer no futuro.
A investigadora estudou a relação que a criança estabelece com o pai, concluindo que esta manifesta igualmente sinais de angústia quando o pai abandona a sala. Porém, constatou que o sofrimento era maior quando a mãe deixava e a alegria era maior quando ela voltava.
Isto deve-se ao papel que o pai e a mãe desempenham na nossa sociedade, em que é a mulher que tem a seu cargo as crianças.
“A mãe é uma necessidade biológica, o pai um acidente social.”- Margaret Meald.
Críticas:
- Carácter artificial pode conduzir a conclusões desadequadas sobre a relação mãe-filho. Os investigadores procuram complementá-la com observações de crianças em situação natural, nos contextos de vida.
- Caracterização do tipo de vinculação, que serve de referência à classificação proposta por Ainsworth que se enquadra no contexto da sociedade ocidental e, nesta, em determinados modelos de família.
- Existem diferentes expectativas das mães que correspondem necessariamente a comportamentos distintos por parte dos bebés e que, por isso, o único modelo de avaliação pode conduzir a conclusões incorretas.